Um pássaro azul

Por Tânia Souza 

Um pássaro azul veio ao meu quintal. Espere, ao quintal não, parou na velha castanheira da calçada e, sentindo o cheiro de leve das plantas que ainda pouco eu molhara, ousou um pouco mais. Era pequeno e buscava nas folhas, um restinho de chuvas.

Um pássaro azul teve sede e venceu o medo. Chegaram logo depois, o verdinho, o pequenino se escondendo entre as folhas e um pardal afoito por coisinhas de terra e chão.

Pensei ter visto um curió, mas talvez tenha sido nostalgia. Os dias andavam ásperos e a tarde estava tão seca que minha garganta rachava em tristezas indizíveis. Eu estava atrasada, mas, ainda assim, juntei água em uma bacia e a eles ofereci, bem no meio do quintal. Quem sabe, isso fosse legal. 

E foi, espiei da janela quando eles chegaram. Fiquei contente, se meus olhos estão ardendo, e há poeira, fuligem, asfalto e prédios por todos os lados, se tudo que temos é essa ausência de tudo, foi meu tolo ser que desejou ofertar a eles esse presente. Mesmo sendo esse tão artificial manancial.

Um pássaro azul veio ao meu quintal. Havia uma bacia com água fresca e o ar tão seco que os olhos choraram apenas por ser.

Teve sede e venceu o medo.

Depois, periquitos, beija-flores e outras criaturinhas aladas estiveram por ali.

E rasgando a tarde bem ao meio, um gavião. Ele também chegou. Mas não em busca de água ou castanhas. Chegou e logo se foi.

Eu sei quem ele levou.

O pássaro azul nunca mais voltou, os outros, foram se achegando aos poucos, a sede era maior que o medo. Mais tarde, choveu. E quando a chuva caiu, meus olhos pararam de arder, mas havia uma dor rasgando minha garganta e...

E nada mais.

Eu simplesmente me calei e todas aquelas velhas dores sem viço estremeceram em mim e de leve, sussurrei um pedido de perdão ao pássaro azul da tarde.

Um dia e uma noite inteira, choveu. E quando o sol voltou, logo ao amanhecer, a bacia ainda estava lá.

Tânia Souza

Dessas histórias meio vividas, meio inventadas.


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